Sequenciamento dos genomas de primatas da Amazônia contribui com estudos sobre doenças genéticas humanas

Ao comparar os genomas de 809 indivíduos primatas não humanos de 233 espécies com o humano, a pesquisa identificou 4,3 milhões de mutações missense comuns que afetam a composição de aminoácidos e podem alterar a função das proteínas, levando a muitas doenças humanas.

Os professores do Departamento de Genética do Instituto de Ciências Biológicas da UFAM, Izeni Farias e Tomas Hrbek, são co-autores em dois artigos e uma síntese publicada pela prestigiosa revista Science publicados em uma edição especial sobre os genomas dos primatas neste dia 02 de junho de 2023.

Ambos os artigos são baseados numa genômica comparativa dos primatas mundiais, um esforço somente possível pela colaboração de vários pesquisadores de várias instituições de pesquisa, liderado pelo Institute of Evolutionary Biology (IBE, CSIC-UPF), Pompeu Fabra University, Illumina, e Baylor College of Medicine.

A UFAM entrou como instituição participante pela relevante contribuição dos dois professores da UFAM/ICB/DGEN, Izeni Farias e Tomas Hrbek, os quais coordenaram o Projeto SISBIOTA, que teve financiamento do CNPq e FAPEAM no período de 2011 a 2015. Durante este projeto, foram feitas seis expedições na Amazônia visando colher amostras de vários grupos de vertebrados, e buscando conhecer mais sua diversidade, principalmente a não conhecida. Um dos grupos que mais gerou informações foram os primatas, e essa amostragem faz parte dos trabalhos publicados hoje na Science.

A professora Izeni relata que o primeiro artigo (Kuderna e colaboradores) trata do sequenciamento completo de genomas de 233 espécies de primatas, representando todos os principais grupos de primatas do mundo. Com esses genomas, foi descoberto que a diversidade genética dentro das espécies entre famílias e regiões geográficas está associada ao clima e à sociabilidade.

A diversidade genética atual não é ou só é fracamente associada com o grau de ameaça caracterizada pela Lista vermelha de espécies ameaçadas. A diversidade genética dos primatas neotropicais (principalmente Amazônicos) está abaixo da média da diversidade de todos os primatas, mas ainda maior do que da população humana. Um dos resultados mais interessantes é a observação de que a acumulação das variações genéticas está correlacionada com o tamanho das populações e os tempos geracionais.

Também foram observadas muitas variações nos genes de proteínas, que anteriormente eram consideradas específicas de humanos. Segundo a professora Izeni, “estudar as variações genéticas nos primatas é fundamental para entendermos a evolução dos primatas, a evolução de nossa espécie, bem como entender as variações relacionadas com as doenças humanas”.

O segundo artigo (Gao e colaboradores) estudou as variantes genômicas observadas nos humanos e primatas, e a relevância dessas variantes para doenças humanas. O professor Tomas explica que, especificamente, Gao e colaboradores catalogaram todas as variantes observadas nos genes das populações humanas e nos 809 genomas das 233 espécies de primatas sequenciadas.

Eles analisaram os efeitos das diferenças nos mesmos genes entre os humanos e os demais primatas, identificando somente 39 genes, dos quais, a maioria está associada com doenças hereditárias humanas, mas permanecem em nosso genoma por conferir proteção contra patógenos ambientais. Outro gene de interesse que evolui de uma maneira diferente nos humanos é o gene responsável pela manutenção das pontas dos cromossomos (telômeros), permitindo a longa vida dos humanos. Segundo o professor Tomas, no artigo de Gao e colaboradores, “usou-se a classificação clínica das variantes gênicas dos humanos caracterizadas pela mudança tridimensional das proteínas causadas por essas variantes para treinar um modelo da inteligência artificial”.

Com esse modelo, caracterizou-se os efeitos dos 4.3 milhões de mutações conhecidas nos humanos, mas clinicamente não caracterizadas. Essa caracterização resultou em identificação de vários genes, inclusive aqueles causadores da deficiência intelectual e desordens de desenvolvimento neural. Além disso, o modelo da inteligência artificial consegue prever os efeitos clínicos de qualquer mutação observada ou ainda não observada na população humana. Esses achados têm inúmeras implicações clínicas com grande potencial para uma medicina genômica personalizada em um futuro muito próximo.

Com esses artigos, a professora Izeni enfatiza a importância de estudos das ciências básicas, como as do artigo de Kuderna e colaboradores, nos achados das ciências mais aplicadas, como os artigos de Gao e colaboradores.

Izeni Farias foi recentemente listada no ranking dos 100 pesquisadores mais citados na área de Ecologia e Evolução do Brasil, e, junto com Tomas Hrbek, coordena o Laboratório de Evolução e Genética Animal do Departamento de Genética (ICB/UFAM).
O trabalho contou ainda com a colaboração de pesquisadores de instituições como UFPA, INPA, IDSM, UFRO, UFMT, dentre outras.

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