Posso dar minha humilde opinião?

Professor de Direito Constitucional Faculdade Santa Teresa, Anderson Fonseca. Foto: Divulgação

Por Anderson Fonseca

Uma vez mais em nosso país temos que lidar com uma situação quem sabe já esquecida por muitos daqueles que pertencem às gerações X (nascidos entre 1965 e 1981), Y (nascidos entre 1982 e 1994) e, certamente, pouco ou quase não vivenciada pela dita geração Z (nascidos entre 1995 e 2010). Sem esquecer da geração hoje da melhor idade, que conviveu com as atividades do então departamento de imprensa e propaganda (DIP) na era Vargas, cujo objetivo era, dentre outros, “fazer censura do teatro, cinema, das funções recreativas e esportivas, da radiodifusão, da literatura social e política e da imprensa”.

Falamos, é claro, do direito consagrado em nossa Constituição Republicana (Art.5º., V), de manifestar nosso pensamento ou opinião, seja esta externada por meio de mensagens faladas, escritas, gestos, expressões corporais, imagens e no mundo digital em que vivemos: postagens, memes, mensagens de correio eletrônico (email), texto com ou sem imagens (whatsapp, telegram, facebook) marcações, cancelamentos, likes e outros.

Como dito pelo Ministro Luiz Roberto Barroso (Rcl 22.328-RJ) “como o passado condenava, a Constituição de 1988 foi obsessiva na proteção da liberdade de expressão, nas suas diversas formas de manifestação, aí incluídas a liberdade de informação, de imprensa e de manifestação de pensamento em geral: intelectual, artístico, científico, etc”

Importante neste ponto esclarecer ao leitor que este direito fundamental tem por objeto a liberdade de conteúdo e por objetivo a sua comunicação a uma audiência plural, fortalecendo a abertura de novos conhecimentos e, assim, a capacidade de aprendizagem de uma sociedade. Como compreendido em nível maior, o exercício da democracia não se esgota no ato secreto da votação, tampouco no que ocorre no âmbito dos três poderes, mas, sobretudo, na comunicação de ideias de maneira aberta, tornando possível a formação de uma opinião política crítica.

Esta liberdade guarda também funções outras, como por exemplo a descoberta da personalidade e a autorepresentação, tendo por fim o desenvolvimento de cada indivíduo. Desenvolvimento este não somente político, mas na vasta gama de assuntos cuja tematização guarde interesse.

Deva se dizer, também, da importância social da liberdade de expressão na concorrência intelectual pela qualidade das ideias expostas na arena pública ou privada, concorrência em que pelo menos em tese as melhores ideias se impõem e produzem efeito.

Pelo até aqui explanado, há a tendência de pensarmos que esta liberdade pode ser exercida de modo absoluto, afinal de contas a opinião é minha e ninguém tem nada a ver com isto, não é mesmo? Ora, basta remetermos o leitor ao recente episódio envolvendo os agora mais conhecidos Kim Kataguiri (DEM-SP) e Tabata Amaral (PSB-SP), para vermos como a liberdade de expressão se tornou o assunto do momento, com o deputado do DEM dizendo que a Alemanha errou ao proibir o Partido Nazista após o término da Segunda Guerra Mundial. Depois, o youtuber Bruno Aiub, conhecido como Monark, defender a legalização de um partido nazista no Brasil.

Neste ponto cabe este articulista indagar, posso dar minha humilde opinião? Com a permissão concedida, basta dizer que esqueceram os protagonistas desta infeliz história que a própria Constituição prevê que a liberdade de expressão, por mais importante e relevante que seja, não é absoluta. Manifestações que causem dano material, moral ou à imagem de outrem geram, no mínimo, o direito de resposta, além de justa indenização, sem falar nas ações penais em casos de crimes contra a honra.

Para aqueles afetos as redes sociais (e nestes dias em que vivemos totalmente conectados, quem não é?) devemos alertar que todas as formas de manifestação de pensamento guardam alguma espécie de limitação. A suposta maneira anônima de mandar mensagens, fakes ou verdadeiras, eventualmente e com o uso de tecnologias adequadas podem ser descobertas e os autores devidamente responsabilizados.

Não esquecendo que até mesmo os casos de omissão em se tolir discussões ou manifestações feitas por terceiros podem gerar responsabilidade, tal é o caso julgado em 2018 pelo Tribunal de Justiça de São Paulo em que administradores de grupos de WhatsApp foram responsabilizados por ofensas feitas por membros, visto não agir para impedi-las ou coibi-las, já que tinham o poder de excluir ou adicionar pessoas.

Desta maneira, resta incontroverso que, no tocante à liberdade de expressão, vale a máxima de que você pode e tem o direito garantido de dizer o que pensa, mas nem tudo o que você pensa pode ser dito. É isso.

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