Ana Cláudia Leocádio Gioia
Em algum momento da vida você já ouviu falar em “ervas da Provença” ou “molho à provençal”. São termos que nos remetem aos aromas e sabores de uma das mais belas regiões da França, localizada no sul do país, numa faixa que chega até a costa do Mediterrâneo. Sem mencionar os imensos campos de lavanda, que colorem de cor violeta a paisagem, no início do verão europeu, entre a metade do mês de julho e início de agosto.
Junto aos Alpes e à Riviera Francesa (chamada Côte D’Azur, em francês), a “Provence” forma uma das 18 regiões francesas, com características bem marcantes como a ênfase à dieta mediterrânea e a cultura das ervas e flores, graças ao clima mais quente e ensolarado da região. Localiza-se na Provence a cidade de Avignon, que chegou a ser a morada de nove papas da Igreja Católica, entre os séculos XIV e XV, eternizada na canção infantil “sur le pont d’Avigon” (sobre a ponte d’Avignon, em tradução livre).
O uso de ervas aromáticas na cozinha francesa é, praticamente, uma obrigação, seja no preparo de legumes, como o famoso “ratatouille”, feito de tomates, berinjelas e abobrinhas principalmente, seja no de carnes em geral. Nas feiras e mercados, podemos comprar os “aromates” frescos em separado, mas nas lojas há muitas opções das ervas desidratadas e misturadas em proporções específicas.
De modo geral, são consideradas “ervas de Provença” o tomilho, o alecrim, o orégano, a sálvia, a manjerona, o louro, a salsinha, o estragão e a sarriette, sendo a última muito parecida com o alecrim, mas de aroma mais suave. Isso também depende, no entanto, da estação, porque, geralmente, há uma dispersão de plantações na região.
Na França, a proporção certificada da mistura das ervas, pelo selo “Label Rouge”, é de 19% de tomilho, 27% de alecrim, 27% de sarriette e 27% de orégano. A estampa foi criada na década de 1960 por lei, no intuito de diferenciar os produtos excepcionais em comparação aos similares. Mas no dia a dia, a palavra final é do cozinheiro, que define o tipo de aroma que deseja dar ao prato.
Lembro-me da primeira vez que ouvi falar em “ervas de Provence”. Foi em Brasília, quando uma amiga amazonense me pediu para preparar o pato no tucupi, mas que usasse aquela mistura especial, comprada na Europa, em sua última viagem. Com ela, fiz uma marinada de 24 horas no pato, antes de assá-lo, e ficou realmente muito delicioso junto ao tucupi e jambu. Que os amantes da cozinha amazônica não me condenem por executar esta missão bem pensada pela minha conterrânea.
O “sauce à provençale” (molho à provençal) também é das receitas bem conhecidas e tradicionais da região, feita à base de tomates, que ganharam os cardápios e mesas pelo mundo. Além dos tomates sem pele, acrescenta-se alho, cebola, cenoura, pimentões, “ervas de Provença” (lógico), azeite e vinho branco.
É importante refogar a cebola, alho e pimentões, juntar um pouco de vinho branco, para depois acrescentar os cubos de tomate. Deixar cozinhar em fogo baixo por, pelo menos, 20 minutos. Ao final, acerta-se o sal, um pouco de pimenta do reino e estará pronto. Quem preferir, pode também dar um toque pessoal colocando abobrinha, berinjela ou cogumelos ao molho e fazer uma saborosa refeição vegetariana.
Visitamos duas vezes a região da Provença, pois numa delas queríamos muito conhecer os famosos campos de lavanda, floridos somente a partir da segunda quinzena de julho até as primeiras duas semanas de agosto, época da colheita. Além da exuberante paisagem de flores, dentre os pratos mais gostosos que experimentamos por lá estão as saladas. Duas em especial ganharam nossa atenção, a “salade provençale” e a “niçoise”, típica da cidade litorânea de Nice.
É uma salada bem simples, mas muito saborosa porque acrescentam às alfaces e outras folhagens bem frescas os pimentões vermelhos assados ou macerados no azeite, tomates, azeitonas e alcachofras, regados ao molho de azeite de oliva e sal. Quando se diz que ingrediente bom é que nos dá bons pratos, essa simples salada é a prova máxima da assertiva dos chefs.
O interessante foi que comemos esta salada no “Le Café la Nuit”, na cidade provençal de Arles, mais conhecido como “Café Van Gogh”. Foi lá que o pintor holandês pós-impressionista o eternizou em quadros, pintados na época em que morou na cidade, em 1888, quando produziu as mais importantes obras de seu acervo, tais como os “Girassóis” e “O Semeador”.
No centro antigo de Nice, uma importante cidade portuária no Sul da Franca, por sua vez, conhecemos a famosa salada “niçoise”. Rica em ingredientes frescos da região, diferencia-se da “provençale” por levar atum e anchova, além de pedaços de ovo cozido, temperada com vinagrete (azeite, sal e vinagre) e um toque final com folhas de manjericão. É uma excelente pedida para refrescar o paladar no calor do verão.
A Provença é muito versátil, com paisagens impressionantes, cânions e lagoas no meio do terreno rochoso, onde o clima favorece o cultivo dos imensos campos de lavanda e girassóis. Mas este é tema para outro artigo porque, nessas nossas andanças, descobrimos que são vários tipos de lavanda com usos e cultivos diferentes, além da cultura das flores usadas na sofisticada indústria de perfumes. Só de conhecer melhor o que são as ervas e o molho que levam o nome da região já vale o esforço de trazer minha latinha com esses aromas mágicos. Próximo passo, agora, é plantar no quintal de casa.