Vanessa Bayma
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MANAUS – | O Brasil já tem seis casos da Ômicron, nova variante considerada de alta transmissão, segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS). Ainda não há registro de casos em Manaus, mas a prefeitura resolveu cancelar a festa de Réveillon por precaução. Diante da possível entrada do vírus na capital, o estado do Amazonas ainda precisa lidar, entre outras questões, com a falta de fiscalização dos protocolos sanitários, necessários para conter a propagação viral.
Na capital, é obrigatório o uso de máscara e, tanto o governo quanto a prefeitura, determinaram que seja exigido o esquema vacinal completo para a realização de grandes eventos, além da restrição de público para que não haja aglomerações. Tudo isso deveria ser fiscalizado na prática, mas tem ficado na teoria.
Em 30 de julho de 2020, na gestão passada da Prefeitura, foi sancionada a LEI Nº 2.643, estabelecendo a obrigatoriedade do uso de máscara de proteção individual pelos residentes no município. No entanto, segundo a Secretaria Municipal de Comunicação (Semcom), daquele período até o novo governo, de David Almeida, a lei, de fato, foi publicada, mas não regulamentada.
“Não está ocorrendo a fiscalização de máscaras. A falta de regulamentação mantém a lei (da gestão anterior) inerte. O que a prefeitura tem feito, tanto no caso das máscaras e das pessoas que não foram se vacinar, é orientar que o façam”, disse o diretor de comunicação da Prefeitura de Manaus, Kleiton Renzo.
A lei, segundo consta no documento, publicada na edição 4893 do Diário Oficial do Município (DOM) e disponível on-line, na internet, tinha validade “enquanto durasse o surto da pandemia” e permitia multa no valor de R$ 108,95, o referente a uma Unidade Fiscal do Município (UFM). No entanto, ainda à época, não foi esclarecido por quem seria realizada essa fiscalização, tampouco quem deveria multar.
O governo do Amazonas, por meio do Decreto nº 42.526, também de 30 de julho de 2020, assinado pelo governador Wilson Lima, tornou obrigatório o uso de máscaras em locais públicos, como medida de segurança. Em caso de descumprimento, a multa seria no valor de uma UFM. E, da mesma forma como o município, não foi informado mais nada sobre a fiscalização e multa.
Um ano depois, no decreto nº 44.442, do dia 23 de agosto de 2021, que consta no Diário Oficial do Estado (DOE), o governador atualizou as regras de enfrentamento à Covid-19. São elas: exigência da carteira de vacinação, com registro de pelo menos a primeira dose de imunização para entrada em estabelecimentos comerciais, como bares, restaurantes etc. As mudanças, segundo consta, foram definidas pelo Comitê Intersetorial de Enfrentamento da Covid-19, do Governo do Estado, com base nos indicadores epidemiológicos e de assistência.
Esse decreto, dessa vez, apontou as responsabilidades de cada órgão sobre a fiscalização. Foi estabelecido que, em caso de descumprimento das regras sanitárias, os órgãos do Sistema Estadual de Segurança Pública, bem como os de fiscalização dos serviços públicos, dentre eles Fundação de Vigilância em Saúde Dra. Rosemary Costa Pinto e o Instituto de Defesa do Consumidor (Procon-AM), ficariam autorizados a aplicar sanções previstas em lei.
As penalidades, definidas nos termos do artigo 268 do Código Penal, eram multa diária de até R$ 50 mil para pessoas jurídicas, a ser duplicada por cada reincidência, e embargo e/ou interdição de estabelecimentos.
O decreto, porém, teve validade até o dia 5 de setembro deste ano.
O Canal Três pediu informações da Secretaria de Estado da Comunicação – Secom acerca da quantidade de multas por falta de uso de máscara, que teriam sido feitas durante a vigência do decreto, e detalhes das fiscalizações realizadas, assim como a existência de algum decreto que tenha saído após o mês de setembro, mas não obteve respostas até a publicação desta reportagem.
Sobre exigência do esquema vacinal completo, ficou sob a responsabilidade dos organizadores de eventos, mas também não há informação sobre quem fiscaliza esse processo na hora de liberar a entrada.
Responsabilidade
Entretanto, tanto a FVS quanto o Procon-AM, disseram que não são responsáveis por fiscalizar, bem como aplicar sanções. Em nota, a FVS informou que “a aplicação de multas por não uso de máscara de proteção respiratória é prevista por leis municipais e as prefeituras são responsáveis pela fiscalização, recebimento de denúncias por não uso do equipamento e aplicação das multas por essa infração, portanto, não compete à FVS aplicação de multas”. Os outros pontos, como esquema vacinal e aglomeração, também seriam de responsabilidade da Prefeitura.
O Procon-AM informou que “não atua nesse tipo de demanda, que não representa relação de consumo, foco do órgão. Essa questão é sanitária e o Procon-AM não tem atribuição para atuar neste sentido”, disse a assessoria de comunicação, por nota.
A Secretaria Estadual de Segurança Pública (SSP) confirmou que é comum a polícia realizar fiscalizações, mas não especificamente sobre uso de máscara, esquema vacinal ou aglomerações. Os policiais da SPP atuam apenas acompanhando os outros órgãos que solicitam apoio e não multam.
No caso de vistoria, foram feitas 2.644 em estabelecimentos, entre bares, restaurantes, flutuantes e festas clandestinas, de janeiro a 13 de novembro deste ano.
“A SSP-AM coordena as fiscalizações e reuniões de colegiado, que envolvem órgãos da esfera municipal e estadual, através da Secretaria Executiva-Adjunta de Planejamento e Gestão Integrada de Segurança (Seagi). As polícias Civil e Militar também participam ativamente das ações, visando a manutenção da ordem durante as fiscalizações, ficando a cargo apenas dos órgãos regulamentadores as notificações e autuações aos estabelecimentos, quando necessário”, informou a assessoria de comunicação da SSP-AM, por meio de nota.
Ainda de acordo com a SSP, dos locais vistoriados, 323 foram autuados por algum tipo de irregularidade, entre elas, o descumprimento de decreto governamental, além de horário de funcionamento, ausência de Auto de Vistoria do Corpo de Bombeiros (AVCB), entre outros. Essas autuações, no entanto, segundo a SSP, ficariam à cargo da FVS e Procon, por exemplo, que disseram, como já explicado, que não possuem essa responsabilidade.
No entanto, não foi informado quanto, destes números, foi por aglomeração, não uso de máscara ou não comprovante de carteira vacinal. A SSP informou, ainda, que possui esses números porque, como acompanha as fiscalizações, faz o registro.
Prejuízo aos amazonenses
De acordo com o epidemiologista e pesquisador da Fiocruz Amazônia, Jesem Orellana, do ponto de vista epidemiológico, a falta de fiscalização dos protocolos, em Manaus, é um erro.
“O poder público, em especial, deveria endurecer a fiscalização, especialmente em ambientes fechados, de qualquer natureza”, opinou o epidemiologista.
De acordo com Jesem, ainda há dúvidas em relação ao real potencial de transmissibilidade da Ômicron, mas os protocolos sanitários deveriam ser seguidos mais à risca, principalmente neste momento de incertezas, onde a variante já infectou seis brasileiros. “Independentemente da variante, seja ela conhecida ou não, as medidas não farmacológicas, como o uso adequado de máscaras, evitar aglomerações e higienização das mãos, seguem sendo altamente efetivas e ainda não podem ser abandonadas. Devem ser reforçadas”, pontuou.
O epidemiologista também chamou a atenção para os eventos de grande público, como o Carnaval. O prefeito de Manaus, David Almeida, chegou a dizer no mês passado, quando fez o aporte financeiro às escolas, que iria acompanhar a evolução da Covid-19 e até o dia 10, aproximadamente, definiria melhor quanto à realização do evento.
“Há tempo para avaliar o Carnaval, mas enquanto isso, devemos ficar atentos à transmissão comunitária descontrolada novamente, se houver muitos casos aqui novamente e dessa nova variante. Podemos ter saturação de nossa precária rede médico-hospitalar, incluindo a problemática testagem ou diagnóstico dos casos suspeitos ou confirmados”, explicou.
A falta de testagem, inclusive, é um ponto sempre batido por Jesem: “Geralmente as pessoas só procuram as unidades de saúde em caso de agravamento de doença. Portanto, o forte predomínio de casos assintomáticos ou leves/moderados, leva as secretarias a não notificarem casos novos, uma vez que praticamente inexiste busca ativa de casos na comunidade”.
Comunicado
Na última quarta-feira (1º), a FVS emitiu comunicado de risco às secretarias municipais de saúde do estado, para que seja notificado imediatamente qualquer paciente sintomático e confirmado, que tenha vindo de outros países com ocorrência de Ômicron.
A FVS pediu estratégias para intensificação da vacinação; aplicação de dose de reforço para todos os adultos que já possam receber a dose; reforço às campanhas de incentivo junto à comunidade, para uso de máscaras, limpeza das mãos e distanciamento social.
Atualmente, o Amazonas totalizou 430.519 casos da doença no estado, segundo a FVS. Até esta segunda (6), foi informado o diagnóstico de 83 novos casos.