DA REDAÇÃO
CURITIBA – | O processo de cassação de mandato do vereador Renato Freitas (PT), na Câmara Municipal de Curitiba, cujo relatório deveria ser votado em reunião do Conselho de Ética, nesta terça-feira (10), ganhou contornos facista e de extremo racismo com o teor de um e-mail enviado a ele, na segunda-feira (9) cuja autoria está sendo investigada pela Câmara e pela Polícia.
O surpreendente, além do próprio conteúdo do e-mail, recheado de palavras de ameaça e de racismo, é o endereço do remetente: o e-mail corporativo do vereador Sidnei Toaldo (Patriota), relator do processo de cassação contra Renato Freitas. A linha de investigação da CMC e da Polícia é de que alguém que tem acesso direto ao e-mail do vereador se encarregou de enviar a mensagem racista, uma vez que Toaldo nega a autoria e o envio.
“Nós estamos pedindo à Câmara que faça todo tipo de investigação necessária, como localizar o IP de onde a mensagem foi enviada, além de verificar as câmeras de segurança para chegar ao autor do envio”, disse Renato Freitas, em entrevista aos veículos locais. O outro pedido do vereador é que o julgamento do parecer seja suspenso até que se chegue ao autor ou autores do ataque racista.
A Mensagem – O teor do e-mail, que ganhou repercussão na imprensa e redes sociais desde a segunda-feira, traz ofensas, ameaças e o tom é de extremo racismo, com propostas facistas, como a de “branquear” Curitiba e a Região Sul.
“Eu não tenho medo de você ou dos esquerdistas vagabundos que o defendem, seu negro…a Câmara de vereadores de Curitiba não é o seu lugar, Renato. Volte para a senzala. E depois de você, vamos dar um jeito de cassar a Carol Dartora – primeira mulher negra eleita vereadora em Curitiba – e o Herivelto – Herivelto Oliveira, jornalista em seu segundo mandato como vereador de Curitiba -…vamos branquear Curitiba e a região Sul queira você ou não. Seu negrinho”, diz a mensagem.
Em outros trechos a mensagem diz: “já metemos pressão na Indiara e na Noêmia”. As duas são vereadoras da CMB e ainda não haviam fechado questão em relação ao voto do processo contra Renato Freitas. Elas são consideradas peças-chaves do processo, porque seus votos definiriam o destino do vereador.
O vereador, de cujo e-mail corporativo saiu a mensagem, alega não ser autor do mesmo e afirmou, em entrevista a um veículo de Curitiba, que está em casa, afastado de suas funções, por ter testado positivo para Covid-19. “Nunca escreveria isso. Tenho amigos negros aos quais respeito mais que a muitos brancos”, afirmou.
O relatório de Toaldo é favorável à cassação de mandato de Renato Freitas, mas ele garante que o que o levou a esse caminho não foi o racismo, mas seu entendimento do caso que está em julgamento. Ele disse que também iria pedir investigações à Câmara para elucidar a autoria do e-mail.
O processo – Renato Freitas é alvo de uma representação no Conselho de Ética por ter protestado, no dia 5 de fevereiro, dentro da Igreja do Rosário, no Largo da Ordem, em Curitiba, contra o assassinato de dois homens negros. A própria Igreja Católica, por meio da Arquidiocese, afirmou ser contra a cassação do vereador, e sugeriu uma pena mais branda.
Na sessão do Conselho de Ética que deverá acontecer nesta terça-feira, se o pedido de adiamento não for acatado, os vereadores poderão escolher apoiar o voto de Sidnei Toaldo, que pede a cassação do petista, ou optar por uma punição mais leve. Existe ainda a possibilidade de arquivamento do caso. A punição sugerida pelo Conselho será levada a votação no plenário.
Racismo – Os casos de racismo no Brasil vêm crescendo de forma assustadora. Somente em São Paulo, por exemplo, de janeiro a abril deste ano, as denúncias de discriminação racial registradas pela Ouvidoria da Secretara de Justiça e Cidadania do Estado, dispararam para 174, 150 a mais que as registradas no mesmo período de 2021 e maior que as ocorrências durante todo o ano passado, que somaram 155.
No Rio de Janeiro, uma outra pesquisa do Centro de Estudos de Segurança e Cidadania do Estado, publicada em fevereiro, mostrou outra face do racismo: a abordagem policial. De acordo com a pesquisa, 68% das pessoas abordadas a pé e 71% no transporte público são negras. Além disso, 17% já foram paradas pela polícia mais de 10 vezes e 15% de seis a 10 vezes. Entre as que tiveram as casas revistadas pela polícia, 79% eram negros, bem como 74% das pessoas que tiveram parentes ou amigos mortos pela polícia.
A pesquisa também foi aprofundada com grupos de jovens moradores de favelas, entregadores, motoristas de aplicativos, mulheres e policiais. Em todas as situações analisadas, a proporção de negros é significativamente maior, acima de 67% dos pesquisados.