REDAÇÃO
MANAUS – |A Região Metropolitana de Manaus é campeã em desigualdade social, atingindo 0,536 na escala Gine (que mede o grau de distribuição de renda entre a população, indo de zero a 1, sendo o zero de absoluta igualdade e 1 de absoluta concentração de renda). Também é, entre as 22 regiões metropolitanas do país, a que apresenta a segunda menor média de rendimento (R$ 967), perdendo apenas para a Região Metropolitana de São Luiz, e tem mais de 40% da sua população em situação de pobreza.
Os dados fazem parte do 9º Boletim Observatório das Metrópolis, fruto de uma parceria entre a PUCRS, o Observatório das Metrópoles e a RedODSAL. O estudo apresenta dados preocupantes sobre a situação da pobreza nas metrópoles brasileiras, onde vivem mais de 80 milhões de pessoas. Entre 2014 e 2021 a taxa de pobreza (renda de, aproximadamente, R$ 465 per capita/mês) subiu de 16% para 23,7%, o que em termos absolutos se traduziu em uma elevação de 12,5 milhões para 19,8 milhões de pessoas. Ou seja, em apenas sete anos 7,2 milhões de pessoas entraram em situação de pobreza nas metrópoles brasileiras. Em relação à extrema pobreza (renda de, aproximadamente, R$ 160 per capita /mês), no mesmo período a taxa mais do que dobrou, variando de 2.7% para 6.3%. Em termos absolutos, foi um aumento de 2,1 para 5,2 milhões de pessoas em situação de extrema pobreza nas nossas grandes cidades.
Segundo André Salata, professor da PUCRS e um dos coordenadores do estudo, os efeitos da pandemia de Covid-19 agravaram uma situação que já vinha piorando há alguns anos: “A piora da maior parte dos indicadores sociais começa entre 2014 e 2015, e a pandemia age então sobre um patamar de vulnerabilidade que já estava muito elevado mesmo para os nossos padrões”, afirma.
É o caso, por exemplo, do que ocorre com a renda dos mais pobres. Em 2014, os 40% mais pobres das regiões metropolitanas tinham renda média de R$ 515. Cinco anos depois, em 2019, essa cifra havia caído para R$ 470. E dois anos depois, já no contexto da pandemia, em 2021, a média chegou a R$ 396.
Segundo Marcelo Ribeiro, professor do IPPUR-UFRJ e um dos coordenadores do estudo, “mesmo num momento de crescimento da média de renda geral, como aquele que se deu entre 2015 e 2019, a tendência foi de redução ou estagnação da renda dos mais pobres, o que significa que apenas os mais abastados se aproveitaram do aumento de recursos naquele período”.
Por essa razão, conforme também mostra o estudo, a tendência tem sido de aumento das desigualdades nos últimos anos. Tendência esta que foi agravada durante a pandemia. “Estas são as desigualdades que vemos no dia a dia, em nosso cotidiano. São verdadeiros abismos sociais que podem se revelar num trajeto de menos de 15 minutos em muitas de nossas cidades, e que se tornaram ainda mais graves ao longo dos últimos anos, como mostram os dados”, pontua Salata.
Como efeito da pandemia, não somente as desigualdades aumentaram como a média de rendimentos caiu e atingiu os menores valores da série histórica. Se em 2019 o rendimento médio era de R$ 1.935, em 2020 ele havia caído para R$ 1.830, e em 2021 chegava a R$ 1.698. No Distrito Federal, a renda média caiu de R$ 2.784 para R$ 2.476 naquele período. Na região metropolitana de Recife a queda foi de R$ 1.593 para R$ 1.079. E em Porto Alegre foi de R$ 2.218 para R$ 1.947.
“A pandemia gerou o pior cenário possível, com queda brutal da média de renda e aumento significativo das desigualdades. Isso significa que a população das nossas metrópoles está, em geral, mais empobrecida, e os recursos mais concentrados entre os estratos mais altos. A consequência esperada e mais palpável disso é o aumento da pobreza e da extrema pobreza”, afirma Marcelo Ribeiro.
O estudo também mostra que os efeitos da pandemia de Covid-19 sobre indicadores de pobreza e desigualdades se fizeram sentir a partir de 2021, quando aumentaram abruptamente. Entre o final de 2020 e o início de 2021, segundo os dados do estudo, a taxa de pobreza aumenta rapidamente de 19% para 24,7%, e a extrema pobreza sobe de 4,1% para 6,7%. Segundo Andre Salata, “a piora súbita dos indicadores de pobreza e desigualdades se dá logo no primeiro trimestre de 2021, justamente quando o governo federal decide interromper o pagamento do Auxílio Emergencial, a partir de uma avaliação equivocada da situação.”
Os coordenadores do estudo enfatizam que uma série de fatores explicam a piora dos indicadores sociais nas regiões metropolitanas brasileiras ao longo dos últimos anos, incluindo o aumento da taxa de desocupação entre 2014 e 2017, a redução da atividade econômica naquele período, a estagnação dos programas de transferência de renda em termos de valores de corte e número de beneficiários, a perda do poder de compra do salário mínimo e, nos últimos anos, o choque da pandemia e o aumento da inflação.
Segundo Marcelo Ribeiro, “diante de um quadro de tamanha gravidade, é preciso agir com urgência no sentido de estimular a criação de empregos e, também, de garantir que o Estado consiga atender aos mais pobres com políticas sociais robustas, bem desenhadas e sustentáveis”.